sábado, 4 de junho de 2011

FICHAMENTO 8


GARCIA, Eloi S.; CHAMAS, Claudia Inês. Genética molecular: avanços e problemas. Caderno de Saúde Publica, Rio de Janeiro, v. 12, n. 1, p.103-107, 1996. Jan-mar.

Genética molecular: avanços e problemas

A partir de 1972 uma série de descobertas revolucionou o estudo da genética e permitiu o surgimento de uma “nova ciência”, a genética molecular ou engenharia genética – um conjunto de técnicas onde um determinado fragmento de DNA (ácido desoxirribonucléico) é isolado e os genes são purificados, examinados e manipulados:a descoberta de enzimas que tinham a propriedade de clivar (hidrolisar) material genético em locais específicos (seqüênciasnucleotídicas) dos genes, dividindo a dupla hélice do DNA em pedaços menores – estas enzimas foram chamadas de enzimas de restrição;a descoberta de enzimas capazes de unirem fragmentos de DNA (genes) – enzimas de ligação; ea descoberta de inúmeros microcromossomos(miniorganismos) – os plasmídios, usados como vetores de fragmentos de DNA. Estava começando uma nova tecnologia baseada na expansão do conhecimento sobre o DNA.Daí para a tecnologia de DNA recombinante dominar a ciência biológica e biomédica foi um passo. Tornou-se possível o uso de sondas (“probes”) genéticas – pedaços de genes ou cópias de DNA complementar – para hibridização.A genética molecular pode ser utilizada para fazer com que genes estranhos sejam expressos em bactérias e leveduras ou mesmo em outras células superiores.No final dos anos 70 até meados dos anos 80 foram criadas nos EUA várias companhias que se propunham desenvolver comercialmente produtos utilizando estas metodologias. Foi um verdadeiro “boom” na época. Acreditava- se em um novo milagre industrial.Logo depois veio o desencantamento. Nem tudo poderia ser realizado pelo conhecimento gerado pela biologia molecular.Hoje já foram reconhecidos outros produtos: vacina contra hepatite B, hormônio de crescimento, ativador de plasminogênio espécie-específico (TPA), alfa-interferon. No entanto, outros produtos não tiveram o mesmo sucesso no mercado.O Projeto Genoma Humano está causando uma grande mobilização e esforço de vários países para mapear e investigar o conjunto dos genes humanos. Deve-se lembrar que o complemento total dos cromossomos humanos no núcleo celular contém o equivalente a 3 bilhões de pares de bases.Estima-se que o ser humano tenha de 50.000 a 100.000 distintos genes funcionais contidos em 23 pares de cromossomos.O Projeto Genoma Humano é considerado o mais ambicioso projeto científico realizado neste século. Seu custo é de cerca de 2,5 bilhões de dólares. O biólogo norte-americano Dr. James Dewey Watson (n. 1928 – ) – um dos descobridores da estrutura de dupla hélice do DNA e prêmio Nobel em 1962 – sugeriu que 3% deste montante fosseutilizado no estudo dos aspectos éticos, sociais e jurídicos do trabalho.Watson coordenou o Centro Nacional para Pesquisa do Genoma Humano de 1989 a 1992. Em meados de 91, foi anunciado que os NationalInstitutesofHealth estariam tentando patentear seqüências de DNA de genes expressos no cérebro humano. Watson foi totalmente contra esta estratégia e, em abril de 92, pediu demissão, ficando como diretor apenas do Laboratório Cold Spring Harbor. Em seu lugar, assumiu Francis Collins, descobridor do gene da fibrose cística.Nos dias de hoje, se há um campo científico em que pesquisadores e sociedade devem estar juntos e fazer uma grande reflexão é a entrada da engenharia genética na área da saúde.O Projeto Genoma Humano atrai grandes empresas. Os testes para detectar partes falhas do DNA, causadoras de doençascomo a fibrose cística, representam um mercado no valor de US$ 376 milhões ao ano.Os bons cientistas saíram da “torre de marfim” e junto com profissionais da área de saúde, juristas, filósofos e religiosos, começaram o debate com a sociedade sobreo uso da engenharia genética em seres humanos, o patenteamento da vida e a ética.Mas, para a ciência, o impacto social de novas técnicas, por exemplo, de diagnóstico
pré-natal, erros inatos ou mesmo de reprodução humana assistida, necessitam de uma reflexão profunda da sociedade. O genoma humano é imenso e possui milhares de genes. O tamanho do DNA humano facilita alterações e combinações genéticas que podem refletir em conhecidas doenças hereditárias. Por longo tempo, essas doenças eram estudadas baseando-se em observações teratogênicas, as malformações congênitas, ou doenças geneticamente transmissíveis, como a conhecida hemofilia, bastante estudada nos descendentes da família real russa.Após a última guerra os erros inatos começaram a ser investigados pelo refinamento das técnicas citológicas e cariótipos. Os avanços da bioquímica e imunologia permitiram o diagnóstico de várias doenças genéticas relacionadas ao metabolismo – alcaptonúria, cistinúria, hemo-globinopatias, albinismo, etc.A engenharia genética poderia ainda influenciar a medicina no controle da reprodução. Por exemplo, poderia modificar embriões humanos por técnicas transgênicas. Isto quer dizer, manipulação de genes, eliminação de genes “ruins” e inserção de genes “bons” (terapia gênica).É bem verdade que reprodução assistida, principalmente, inseminação artificial, fertilização “in vitro, implante de embrião, já vem sendo usada pela medicina veterinária por vários anos. A medicina humana
começou a usar estas tecnologias mais recentemente.O problema ético é sério. Os conhecimentos sobre a genética humana e animal podem ser explorados economicamente por empresas? A tendência internacional é que prevaleçaas razões econômicas. Acreditamos que em breve as legislações de propriedade industrial dos países em desenvolvimento estarão adaptadas aos novos tempos e à globalização dos mercados, de acordo com a lógica neoliberal. A sociedade precisa refletir e decidir como ela quer e deve utilizar os conhecimentos gerados pela engenharia genética. Não basta ter uma vida saudável e maior expectativa de vida. É necessária uma vida ética e necessariamente mais feliz. Para finalizar, historicamente sabemos que quando Darwin publicou há cerca de 130 anosa obra “A Origem das Espécies”, a sociedade reagiu às idéiaslevantadas pelo cientista sobre “seleção natural”. Este conceito mudou os rumos da biologia nos últimos 100 anos. Hoje a nossa sociedade deve discutir se a manipulação da natureza pelas técnicas de biologia molecular pode levar a uma “seleção induzida/- artificial”.

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